Há muito tempo fui enfeitiçado pela arte. Nem sei dizer onde
isso começou. Creio que deva vir de outra existência.
Na infância fui muito
contemplativo, principalmente nas transições da natureza, quando o céu se petrechava
de nuvens negras e lampejava raios “o estrondo me causava temor, mas não me
constrangia” e depois da chuva ele se transformava em puro azul, quando as folhas se desprendiam dos galhos e forravam os pés das árvores, quando a chuva caia pesada e
transformava as ruas em corredeiras, quando o sol se punha no horizonte, quando
os siriris se punham a rodear a lâmpada acessa, quando a neblina misturava o
mundo com o seu véu que lentamente se esvaia deixando transparecer apenas parte
das coisas, quando os vagalumes enfeitavam de natal o mato ao cair das noites
de verão. Eu ficava fascinado em cada um destes acontecimentos e apaixonado por
algo que não havia palavras para explicar.
A idéia sobre aquilo tudo como na
arte era muito subjetiva, aparentemente não existia utilidade objetiva para
nada daquilo, parecia mais a apresentação de um mega-show, alguém queria me
mostrar do quanto era capaz e eu adorava e tinha o dom de apreciá-lo. Magnífico
mestre de todas as artes, que me desvendava os seus truques, embora, creio, ele
soubesse das minhas limitações.
O tempo passou e misturei-me à mescla dos
homens, aprendi os seus costumes, seus códigos de relacionamentos, seus limites,
seus medos, preconceitos e meias-verdades. O mundo dos homens e suas necessidades
foram proeminentes e me ocuparam demais. Com o passar do tempo, muito de mim
ficou limitado ao meu eu interior, mas a arte continuava lá sempre inquieta
pronta para insidiar o meu cotidiano, costumes e compromissos. Ela me chamava, colocava-se
em meu caminho e a minha frente “quase para eu tropeçar”, o mundo das artes, surgiam
catálogos, revistas de arte, convite para exposições, pessoas envolvidas com as
artes e eu me identificava demais com tudo aquilo. Demorei a perceber isso e
por isso mesmo a minha vida amorosa, econômica e profissional, tiveram muitos
altos e baixos, elas dividiam, sem que me desce conta, espaços com a minha amada
arte.
As outras coisas se dispersavam, mas a arte resistia, continuava lá
procurando por onde se manifestar. Aos poucos fui cedendo e deixando que ela tomasse
conta de meus objetivos de vida “embora em muitas ocasiões e até de forma vulgar ela
praticamente me forçasse de muitas formas a “tela” expressá-la”.
Foi isso tudo o que tornou claro a minha relação com a arte.
Por isso hoje me dedico a ela e espero fazer por merecê-la.
moacir p ponti